Sonntag, August 06, 2006

Sorrisos, Deus e Morfina

Sobre como Almodóvar trilhou os rumos de:

a)Bergman-jovem-e-comediante
"Sorrisos de uma noite de amor" ("Sommarnattens Leende Ano", de 1955) de Ingmar Bergman, estabelecendo conexões notáveis com a peça de W. Shakespeare "Sonhos de uma Noite de verão", retrata o caráter lúdico do amor definindo este como "O jogo preferido dos jovens e cujo os instrumentos consistem em três bolinhas (palavras, coração e órgãos reprodutores) as quais o jogador deve manter no ar, dançando harmonicamente". O amor se reduz à 3 bolinhas nas mãos de um jovem malabarista? Sim, mas "apesar do amor ser um passatempo, os jovens são perfeitamente capazes de amar, entretanto, são capazes de amar apenas a si mesmos e ao amor (na sua contemplação como jogo)". Uma relação que não envolve dois sujeitos, apenas sujeito e objeto.
As mulheres do filme são: uma mulher casada há dois anos que se conserva virgem (lembrando muito a personagem que se divide em duas atrizes em "Esse Obscuro Objeto do Desejo" de Luis Buñel), uma empregada que defende a melhoria do sexo e das relações através da sucessão dos amantes e uma atriz sedutora que não se deixa dominar por nenhuma espécie de gênio masculino. A mulher casada e virgem há dois anos flerta com o filho do marido. O marido flerta com a atriz.


b)Fassbinder, "Martha" e "O Desespero de Veronika Voss"
Na produção alemã "Martha", de 1974 (filme creditado ao livro de Cornel Woolrich , mesmo autor de "Janela Indiscreta", filmado por Hitchcok), Fassbinder já delineava através de um humor sádico as mulheres viciadas (Martha é viciada em emoções) que culminariam em "O Desespero de Veronika Voss", que retrata uma atriz em decadência (diretores adoram esse tema) viciada em morfina.
Podemos chamar de Vício tudo aquilo que não conseguimos controlar apesar da vontade, logo, uma mulher que não consegue controlar as emoções é viciada em suas próprias emoções (aprendi isso em "What the Bleep do We Know", um filme bem moderno sobre física quãntica). É o caso de Martha, uma visível anoréxica que apesar de sofrer maus tratos do marido sádico não consegue sair de uma situação de domínio na qual está viciada.
As mulheres do filme são: a mãe de Martha (que morre de overdose de calmantes no início do filme); a amiga de Martha (aquela para qual Martha confidencia as brutalidades do marido e aconselha Martha a relaxar, pois "o tempo transforma os hábitos mais estranhos dos maridos em banalidades") e Martha, que acaba o filme paralítica sendo conduzida pelo marido em uma cadeira de rodas, aconselhada novamente a relaxar, dessa vez pelo enfermeiro que encerra o filme com a frase "O que Deus determina, ninguém pode mudar".
Há sempre em Fassbinder essa relação de poder, mulheres obedecendo à um Deus Humano e Masculino ou Alucinógeno. Martha é obrigada a fazer sexo com queimaduras solares mas segue até o limite obediente ao seu Deus-Marido, e Veronika, ao seu Deus-Morfina. A relação dessas mulheres com os homens e as drogas é praticamente religiosa: não traz bens palpáveis mas alimenta a alma. Daí até Almodóvar? Coloque uma caixa de calmantes num suco de tomate e uma espanhola enlouquecida gritando "Iban! Iban!" e temos "Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos". Por quê elas estão "nervosas"? Homens. O que fazem para relaxar? Calmantes e cigarros. Embolorado com cenários sérios e mulheres coloridas ou cenários coloridos e mulheres sérias Almodóvar mistura a velha fórmula de Bergman (explicar o amor pelo seu caráter-passatempo e apimentar a narrativa com flertes entre esposa/filha do marido ou vice-versa, como fez em "de Salto Alto") com as mulheres viciadas em sentimentos e drogas de Fassbinder. Detalhe: assim como Almodóvar, Fassbinder era homossexual assumido.

1 Kommentar:

Anonym hat gesagt…

bah surtiu (afú) o efeito do chá de rebulinho :D