Mittwoch, Februar 28, 2007

Cameron Diaz e Drew Barrymore fumando um


Daqui pra frente, só fofoca. Teufelswerk's new way of life. Praia, chapéis, bronzeadores, ceú azul. Daqui pra frente, second life. Minha avó disse que eu não deveria me preocupar com sua morte; ela disse que teve uma vida boa, mas, é claro, só depois que parou de trabalhar. Drew e Cameron trabalham, brigam com os namorados, fumam um. Ninguém pensa nas plantinhas. Ninguém sabe que dentro de cada semente existe um embrião que carrega uma vida ou centenas delas, revestido por uma camada semelhante à placenta do útero. Comer feijão também é assassinato. Eu proponho o canibalismo. Milhares de corpos desperdiçados apodrecendo sem utilidade. Inspiração para filme de terror que se transforma em alimento. Ninguém pensa nisso, ainda. Mas sempre alguém já pensou. É claro que pensam antes em si mesmos, mas, uma praça, um violão e alguns malabares podem abrir várias cabeças para sempre. Quem precisa de um baseado. Vamos salvar as plantinhas e o meio ambiente. Eu penso em tudo isso ainda com o suor no rosto, recém chegada de um ônibus cheio de torcedores de futebol.

Sonntag, Februar 25, 2007

Das Büro



meu peito é uma garrafa vazia?
o mundo nos faz péssimos pais e ótimos avós, mas avós noramalmente desenvolvem doenças degenerativas; o corpo é falho.
me distraio observando a criança de 4 anos maquiando a boneca com pincéis de teclado. o homem de setenta e poucos que dorme em frente à banca de flores em outro país. eu só queria salvá-los.
as cores que entram pelo cabo USB. eu só queros que continuem vivos.
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a cozinha azul e os robôs vestidos de borracha. a roupa branca, suja e furada, o aparelho que urina líquido potável acoplado nos bolsos de metal. a falta que sentiam do cheiro de suor correndo na parte traseira do joelho. eu só quero que me deixem viva.

onde está o meu amor?

eu só quero um pote de leite vermelho, mas, diná, é só um coelho com um relógio.
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a mesa do escritório que meu avô chama de “büro”. os boletins do posto de saúde. a carterinha do convênio. o livrinho com exercícios para os músculos inferiores. as receitas médicas organizadas em pastinhas amarelas com o nome do médico preso em fita durex. eu insistindo para que ele tenha um geriatra, um médico fixo, ele dizendo que geriatra "é tudo charlatão".
meu avô, apesar de um homem durão, sempre enche os olhos d’água. a boca não mexe, os braços não abraçam e nem as mãos tremem, mas os olhos sempre denunciam. óculos escuro é “coisa de bandido”.
e então tem esse olho-aquário que aparece quando meu irmão imita seu jeito de vestir as calças mais perto do peito do que da cintura (aí o olhinho avermelha enquanto a boca engole uma risada seca e murmura uma espécie de expressão sílvio santos, só que sem abrir a boca. difícil imaginar, eu sei. mais difícil é esconder o constrangimento nessas horas, quem choraria por uma piadinha tão boba?). às vezes acontece quando ele conta de algum amigo que morreu. lembro de uma vez ter ido com ele numa dessas reuniões de amigos do colégio. outro dia perguntei por quê não faziam mais as reuniões, e ele disse que todos os colegas haviam morrido.

Donnerstag, Februar 22, 2007

A incomunicabilidade



"A noite" e "O eclipse", de Michelangelo Antonioni.

A coragem

E então vem aquela náusea de café, como a alergia de todos os gostos rotulados e nocivos. Frágil; a vontade de derreter em uma cama macia de lençóis embolotados do próprio suor. Feio, sujo e sincero. Caio Fernando Abreu era um mauricinho?
Entrar molhada na chuva e jogar as meias na única poltrona qualquer e depois deixar a porta do banheiro aberta; não se deve julgar uma pessoa até o dia de sua morte.

Um dia de tempestade foi o ponto de partida para as reflexões de Diná; a chance em uma urgência. Diná era uma compulsiva por certezas.
[As idéias delirantes são ensconderijos de sentimentos primários esquecidos.]
A obsessão pelo que se julga inabalável habita nos devaneios, corre por essas vontades primitvas abandonadas que se dissolvem nas idéias ansiosas. A criança excesssivamente agitada recebe adjetivos idênticos aos da criança que se opõe à moral.
Diná olhava pela janela do ônibus a tempestade que se consumava agora. A mesma já prevista no céu de nunvens cinza-chumbo iluminado apenas pelo alaranjado das lâmpadas penduradas aos postes cheios de fios no alto da avenida em um final de tarde, enquanto as duas se dirigiam ao ponto de ônibus.
O ponto de ônibus que parecia tão longe e os raios tão perto, a mãe que parecia tão alegre elogiando o ar fresco que denunciava os pingos nos óculos de Diná; lentes e janelas no fundo de todos os vidros. A mãe tão alegre, almost dancing in the rain. Mas isso foi antes.
Antes do ônibus cheio e aqueles homens lá no fundo gritando alguma coisa que fazia a mãe abraçar a filha. Diná não tinha medo dos homens, tinha medo da tempestade e não queria ser abraçada. Foi quando pensou que o simples fato de desvencilhar-se da mãe seria uma afronta; mesmo a felicidade da mãe a confrontava.
No entanto, cumprir o dever de forma excessiva a condenaria para sempre a passar o resto da vida em uma praça com balanços e gangorras mas entre muros altos como um reforço contra os desejos. Diná julgou a reflexão por demais ameaçadora. Enquanto isso a chuva aumentava e os homens gritavam palavras confusas que assutavam a mãe, Diná sentia o aperto dos braços pegajosos que apesar de tudo não faziam com que ela se sentisse segura ou mesmo próxima; a criança nunca sabe se a ausência é uma distância, uma alienação ou uma morte. E assim, Diná levantou de seu assento e foi sentar no colo de um dos homens que gritavam.

Dienstag, Februar 20, 2007

Redenção

Eu me exalto.
"O ano em que meus pais saíram de férias" não é um filme sobre a ditadura e nem sobre a infância, é um filme sobre abandono. Ok. E o Iñarritu não é um cara tão ruim.
"Little Children" (porcamente traduzido para "Pecados Íntimos") é sobre dois adultos casados e com filhos que se aproximam devido à síndrome de madame bovary que aflige alguns pais e mães de família. Trata-se de recuperar a infância/esperança perdida; a infância é uma invenção, afinal, e o casamento/adultério também. O filme é mais bobalhão do que todos os outros da semana, mas eu gostei, pelo simples fato de ser mulher. Eu sou bem mulherzinha, às vezes. Eu não quero que coisas ruins aconteçam mas ao invés de tentar impedi-las ou amenizá-las eu vou ao cinema. Eu não sou uma mãe moderna, não tenho família para sustentar mas tenho avós que caem no chão e quebram as costelas. Toda vez que vejo uma ambulância na rua penso que meus avós podem estar dentro dela. Minha mãe não se preocupa como eu, acha sempre que os problemas são pequenos e fáceis de serem resolvidos. O amor é indefinível e bizarro, essa coisa de querer cuidar/estar com alguém e ao mesmo tempo um desejo intrínseco de auto-afirmação dos envolvidos. Quando tinha 17 anos eu escrevi uma poesia que dizia que o amor era como as plantas: se deixamos de regá-las, morrem sedentas; se regamos demais, se afogam. Hoje penso que o problema não é esse. Não importa o quanto você cuidar de um relacionameno; filhos, contas e doenças podem afogá-lo. Aí ou você morre se debatendo até o fim ou mata a sede, é uma questão de extremos. Só que no outro extremo está um terceiro elemento, virtual ou palpável; ou você mata a sede bebendo de outra fonte ou morre afogado e seco ao mesmo tempo.
Mas é fácil ver as coisas boas e simples de uma vida conjugal sem filhos e adultério; como sexo em motéis diferentes com trinta por cento de desconto imprimindo o cupom da internet e chopps pagos com visa electron. Ou as coisas mais complicadas de se apreciar, como a beleza colorida dos dias de sol e gramados verdes diante de seus olhos sóbrios, vigiando bem a máquina fotográfica.
[Se veres uma criança, não confies por ser uma criança, ela vai te sacar.]
A Redenção é uma Ameaça.
Aceitar é uma espécie de morte; dentro de uns 30 anos não haverá mais lugar para reflexões blogais, ou as pessoas estarão desmaiando num calor de 60 graus ou trocando todos os eletrodomésticos por coletes à prova de bala e camisas de força; a sua própria camisa de força comprada por ninguém menos que você, o mundo te convencendo a enlouquecer e reprimir, cuidar e agir. Até rimou. Confissões são poesia, e eu sou você e você, um nenê.

Babel

Um tanto cansativa essa safra já molenga de filmes ao estilo "E.U.A, nosso maior inimigo". Um retrato da época é o diretor Iñarritu, um mexicano obsecado por uma mescla de acidentes, sangue e sofrimento, que acaba compondo um tipo bem conhecido de filme; apegado à construção de cenas um tanto apelativas (ajudadas, em geral, pelo molho de tomate), com o principal objetivo de resolver a ansiedade de estímulo. Contudo, Iñarritu é considerado um verdadeiro "crítico social", usando como matéria prima de sua obra acidentes nos quais os "pseudo-culpados" são sempre mexicanos ou assemelhados prejudicando norte-americanos da alta sociedade. Somam-se a isso as cenas entediantes, porém fotograficamente trabalhadas de forma magistral, de sofrimento e sangue das personagens norte-americanas; sangue e sofrimento suficiente para torcermos por elas até o último segundo do filme, quando percebemos que mesmo sem a nossa torcida os norte-americanos sempre se saem bem e ao tempero final-cinderella. E percebemos que os pseudo-culpados de cabelos negros nem eram tão maus assim.
Iñarritu já tinha dado o recado nos dois filmes anteriores, mas preferiu fazer um terceiro mais-do-mesmo e depois chamar de "trilogia". Inusitado mas pertinente, quem sabe, lembrar Antonioni, que usou na década de 60 o mesmo recurso em sua "trilogia da incominicabilidade", mas foi sincero o bastante para assumir sua futilidade existencialista, bem diferente de pretender prêmios provavelmente envolvidos com a máfia em cima de "preconceito" em filme de 25 milhões de dólares e com um galâ quente para cada nação envolvida. Despretensiosos e bobalhões, os melhores filmes anti-racistas que existem continuam sendo as comédias da sessão da tarde com o Eddie Murphy. E as melhores produções mexicanas continuam sendo as novelas sobre preconceito estético ao estilo "Topázio", a cega deslumbrante.

Sonntag, Februar 18, 2007

ainda sobre Ian McEwan

Eu nunca li Proust.
No entanto, ontem, depois de assistir "Pequena Miss Sunshine", finalmente entendi o que eu quis dizer no post do dia 29 de janeiro: os piores momentos de nossas vidas nos tornam quem somos. Quando o tempo passa rápido, estamos sendo felizes e inúteis para nós mesmos; mas, eu sei, é preciso ter cuidado com esse tipo de interpretação leviana. Não diria que todas as aulas chatas em que os minutos não passavam me tornaram quem eu sou mas, me tornaram, ao menos, mais paciente; no entanto, não foram os "piores" momentos da minha vida, então, não é um bom exemplo. Também não diria que o tempo que utilizei para desbravar lugares novos, quando as horas passam voando e parecem sempre insuficientes (e que talvez seja dos tempos o tempo mais bem gasto e feliz) não colaborou para construir quem eu sou. Mas, em geral, ainda acho que as pessoas são construídas pelos traumas, e que os traumas construídos em um minuto transformam esse um minuto em dez e assim por diante. E acho extremamente louvável colocar isso em forma de literatura, como fez Ian McEwan em "A criança no tempo". Considero um bom exemplo a alucinação do personagem principal:
um homem aos 40 e poucos anos vivencia o momento em que os pais estão discutindo sobre o seu nascimento (ou aborto) numa lanchonete; isso é narrado em uma passagem que enfatiza, inclusive, o homem em pleno transe reproduzindo com exatidão as bicicletas ("A MARCA da bicicleta GRAVADA EM LETRAS DOURADAS") que os pais utilizavam de fato no momento real (ou primeiro) do acontecimento; a ilusão do tempo real desvendada pela insanidade.
Aqueles três minutos de transe representam o início de uma vida inteira, e as bicicletas talvez sejam uma metáfora da velocidade e da MEMÓRIA (aquela que grava as marcas com letras douradas). Qual o motivo da obsessão do homem por qualquer tipo de velocidade exceder a sua obsessão por qualquer tipo de início?
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Ainda sobre tempo e memória, outro filme recente com crianças e idosos: "O ano em que meus pais saíram de férias"; mas, ao contrário de "Pequena Miss Sunshine", que concentra ao redor da criança uma série de diferenciadas problemáticas universais como morte, tédio e fracasso, o filme brasileiro limita-se a focar as verdades/reações infantis construindo um clima que leva a um saudosismo da infância mesclado à informações rasas sobre a época da ditadura; ou seja, mais um da série "para gringo ver". Também tem o queridinho da classe média bem informada que "se mata de rir" graças à sua super-útil consciência social (será o novo humor requintado?): "Borat", sem muitas crianças e idosos porém com bastante mulheres recheadas de plástico e louros de bochecha vermelha que rendem alguns (poucos) momentos antropológicos interessantes (mais interessantes que engraçados, na minha opnião.); mais um da série "Michael Moore is God", porém sem a participação do último rebelde americano chacoalhando com a nação do alto de seus duzentos quilos e remédios para o colesterol. Ah, os britânicos são TÃO refinados.

Freitag, Februar 16, 2007

Matoso

Matoso era um neurótico, o que significa alguém cujas emoções intrínsecas do espírito se movem de tal forma que nelas uma força interior tida como "superior" domina outra entidade interior; essa outra entidade, por assim dizer, corriqueira e manipulável, mas também movimentada por obsessões ligadas ao narcisismo em seu sentido mais contemplativo conformado.
A Força Superior Interior agiria em Matoso (hoje) como uma força superior repressora que compensaria a falta de autoridade do pai durante o seu crescimento como indivído. A falta do pai na infância, especialmente em situações nas quais a criança não tem como sorrir sem um pai ao lado - confie, você nunca verá uma expressão feliz de uma criança sem os pais nesses quase estados de urgência social completa (ex. festinhas de final de ano no colégio, natal, dia dos pais)- fez dele, além de um filho único que amadureceu solitário e triste (longe da janela temendo as abelhas no sétimo andar de um prédio de apartamentos de 1 quarto onde vivia com a mãe), uma vítima da doença; a autopunição.
Em seus sonhos, Matoso via-se a enfeitar bolsos acoplados a roupas de bichinhos de pelúcia, além dos constantes pesadelos com laranjas e nascer do sol. Os elementos infantis teriam sido escolhidos (criados) pela Força Superior Interior (ou Força Exterior Repressora) para mascarar os objetos realmente desejados por Matoso, evitando assim torná-lo um homem angustiado.
Imagens primitivas como todas aquelas relacionadas à recreação, alimentação, vida e morte; estes elementos não chegavam a causar angústia nem ao menos durante o sono, ou seja, os desejos foram totalmente censurados pela Força Superior "Pai Ausente Compensado" Interior.
O sonho angustiado, como não era o caso, já seria uma libertação da neurose, ou seja, a própria angústia. Matoso, como doente neurótico, estaria na realidade se punindo ao censurar seus próprios desejos através de uma construção mental particular e repressora da figura paterna. Nunca na vida o pai o havia presenteado em datas comemorativas, que dirá surrá-lo com uma cinta de couro quando batia na mãe. A punição é uma espécie de alívio; podemos pensar, por exemplo, no alívio como uma "diminuição de peso" e na punição como "cumprimento de pena"; à medida que se cumpre a pena, o peso (meses, anos) diminui. E, desta forma, podemos afirmar, enfim, que Matoso, sonhando com metáforas infantis/ engolidoras de desejos/angústias pela imagem mental paterna, satisfez sua necessidade de encontrar a verdadeira cinta de couro interior; que para sempre o curou dos desejos sexuais narcisísticos prejudiciais transformando-os em buracos de tecido e enchimentos de algodão.

Mittwoch, Februar 14, 2007

Bons ares


Existe um conto do Cortázar em "Las Armas Secretas" cuja personagem principal é uma senhora com ares muito elegantes que costumava servir a grandes outras senhoras da alta sociedade de Buenos Aires, mas que agora não costuma mais ser chamada para servir em festas, talvez pelo envelhecimento das feições, talvez por causa da crise, provavelmente pelos dois, afinal, Cortázar, como a maioria dos bons autores, sempre mistura o lado político/social com problemáticas bem existenciais/individuais das personagens;


I AM YOU AND WHAT I SEE IS ME!


O conto começa com a personagem principal recebendo em sua casa uma madame, e só percebemos que essa personagem principal se encontra em uma classe social inferior a da madame quando a mesma (a personagem principal) lamenta sua falta de cuidado ao "quase oferecer um chá" para madame (e isso pegaria muito mal). Toda essa "áurea" do conto tão bem trabalhada pelo autor acaba sempre me confundindo (como em "Cartas de Mamá" ou "A Casa Tomada") e tenho certeza de que ele faz de propósito. Aliás, o que importa a classe social da empregada se sua atmosfera é tão ou mais glamourosa do que a das pessoas que a contratam? O que importa a relação entre dois ou mais indivíduos se estão envolvidos na mesma rede de angústia? Em um conto, acredito que o que importa é justamente mexer com nosso valores e impressões sociais.



Mas, clichês a parte, o que eu queria dizer é que esta madame visita nossa personagem para contratá-la (e o trabalho estava escasso) para servir em uma festa, e nossa personagem regojiza-se com a idéia de novamente tocar em talheres de prata e copos de cristal; ah, como seria lindo limpar aquelas torneiras de ouro e coisas do tipo. Mas, chegando na festa, a empregada de atmosfera chique descobre que foi contratada para tomar conta dos cachorros da madame (que possuem quarto e colchões próprios).


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Eu não terminei o conto (que se chama "Los Buenos Servicios") e nem pretendia fazer uma análise do mesmo, apenas mostrar como me sinto, de volta ao Brasil.

Não, eu não estava na Europa, estava na Argentina, tão South America quanto nós, e no entanto tão mais lustrosa de cores douradas que emanam seus habitantes. Há mendigos? Muitos, e dormem escondendo o rosto em guarda-chuvas. Pedem dinheiro? Pedem, e não só dinheiro como desculpas por estarem solicitando dinheiro. Não que eu tenha considerado isso louvável do ponto de vista da "boa educação" e sim pelo fato de nos tratarem de igual para igual e não naquele tom de "me agradeça já que não estou te roubando"; o que acontece justamente por também serem tratados de igual para igual por pessoas de classes mais elevadas. Eu, acostumada a cenas clássicas do tipo maltrapilhos sendo escurraçados por donos de bar na Cidade Baixa, fiquei emocionada com o carinho do segurança do Burguer King com algumas menininhas de rua. Não que ele tivesse dado um hamburguer a elas nem paparicado nem nada, mas o jeito como as olhava e sorria e falava em um tom paternal me comoveu. No McDonald's da Andradas os mendigos não podem nem sentar na beirada da calçada, que dirá pedir batatas fritas em paz. Eu, uma menina de classe-média, já fui expulsa pelo porteiro quando sentei em um murinho do prédio "Morada da Redenção". E como tal já fui expulsa da beirada do canteiro do Shpping Praia de Bellas também. Em Buenos Aires, todos sentam na calçada que for, mendigos ou não, seja para entornar cervejas ou descansar os ossos com carne. O máximo que nos aconteceu, bebendo Quilmes litrão em uma escadaria de prédio (muito mais chique que o "Morada da Redenção"), em San Telmo, foi uma senhora dizer: "vocês vão ficar mais confortáveis sentando um pouco mais pra lá, pois aqui é o lado onde abrem a porta". A elegância é preservada graças à consciência política/social, que é muito maior por parte de todos; talvez por muita gente ter empobrecido da noite para o dia (não é como aqui, que apesar de a pobreza aumentar, somos pobres desde sempre) e isso ter gerado uma comoção maior; choque traz solidariedade, afinal. Enfim, dá para perceber uma preocupação e mesmo um afeto dos mais ricos com os mais pobres, uma atmosfera "estamos todos no mesmo barco".


I am you and what I see is me.


Ah, e não existem "latinhas" na Argentina (pelo menos eu não vi nenhuma), as menores coca-colas são vendidas em garrafinhas de vidro de 237 ml.

[O vidro está nos recipientes e nos refletores; frágil e quebradiço como todos os deformadores dos objetos reais e sólidos. Ou líquidos. O vidro também derrama, escorre, derrete, colore. A proteção é ilusória, mas deliciosamente transparente.]