O sentimento que tenho em relação a David Foster Wallace se compararia a um miojo de morango. É tão nojento e irritante (apenas a idéia da existência de um miojo de morango) que sinto cócegas. Cócegas são semi-orgasmos, mas incomodam. Incomodam e fazem rir; mas agora não consigo rir. O cheiro de carlton e cerveja é como um miojo de morango, a mistura do sabor e do nojo, e o nojo é um luto, um trabalho intrapsíquico de elaboração da perda de um objeto amado externo. A perda da razão, a vitória dos DESEJOS. Percorrem meu corpo, sujam minha roupa, pedem um picadinho no bar maroto do centro pelas duas da manhã. Desejos fedem; desejos não se realizam, quando se realizam, são felicidade. Felicidade é ruim, felicidade é contentamento, abnegação, busca encerrada. DESEJOS comandam. David Foster Wallace é puro desejo; desejo de chocar, de incomodar, desejo de não se realizar e continuar sempre travando como um mouse sujo de cabelos e restos de unhas. David Foster Wallace é um grito no ar, perdido, sem fim, sem comunicação, puro LIBERTAR. O LIBERTAR não tem fim, a liberdade não pode nunca alacançar um objetivo, a liberdade é o desejo de estar solto de todas as amarras e as amarras são justamente a necessidade de LIGAÇÃO; a ligação COMPÕE, estabelece, dá vida a novos compostos, químicos, gramaticais; seja o que for, sempre faltam. Faltar, perder, emburrar; regras de uma vida sem escolha. É preciso desembaraço mas, normalmente, a liberdade é como uma licença.
[Ter liberdade é ter permissão ou uma maneira de agir com audácia.]
A FESTA
No dia da festa, pela primeira vez em cinco anos, ele dormiu na posição de um homem infiel. Peito pra cima, braços cruzados em cima do peito; significa que ele até quer ser fiel, mas não consegue. Peito pra cima, braços cruzados, mãos segurando a cabeça, significa que ele é um infiel assumido; um machão orgulhoso de seus culhões fedidos a baixos critérios. Barriga pra baixo, corpo voltado ao colchão; ele quer sexo.
Três, quatro, cinco carreiras; correrias, adaptadores de MP3, danças caretas e frenéticas; só nós dois no salão. Uma criança dormia. A outra, de olheiras fundas, jogava o video-game do papai-noel. O pai das crianças, anfitrião da festa, constrangido, não sabia de adaptadores de MP3, não sabia das crianças, mas sabia das sete, oito, nove, dez, onze carreiras. Constrangido, no banheiro. Constrangido, e vermelho. Constrangido, e malvado. Egoísta, pérfido, só queria compartilhar. Treze, quatorze, quinze carreiras. Ele, o meu amor, no dia da festa, constrangido, mas de constrangimentos bonitos, completos e partidos. Partidos pela necessidade constrangida de compartilhar, de não deixar o pai das crianças que ele, meu amor, amava, ali, sozinho, pérfido, dezoito, dezenove carreiras. Naquele dia da festa ele compartilhou de toda imundíce que seu constrangimento até então o havia impedido de compactuar mas, naquele dia da festa, vendo o pai, assim, sozinho, fodendo com todos, teve que foder também. E dormiu, segundo algum programa de televisão que as donas de casa assistem pela manhã depois que as crianças acordam e enquanto esquentam o leite no microondas, como um homem infiel. E a festa acabou na garagem disfarçada de quarto, com goteiras ao lado da cama e meu amor vomitando o peso de um caráter morto. E o desenho da criança, que dormia ou jogava (ninguém mais sabia) ficou ali, escorregou do imã da geladeira que ficava na garagem gelando as últimas cervejas enquanto eu fumava e pensava nele (o desenho) parado na poça da goteira, submerso. Olhei bem pra ele, uma festa de lápis de cêra que compunha um castelo, afogado. E ele, meu amor, meu anjo azul, entregue ao sono dos infiéis.
Compartilhar imundícies é abdicar da liberdade dos princípios acorrentados.
[Ter liberdade é ter permissão ou uma maneira de agir com audácia.]
A FESTA
No dia da festa, pela primeira vez em cinco anos, ele dormiu na posição de um homem infiel. Peito pra cima, braços cruzados em cima do peito; significa que ele até quer ser fiel, mas não consegue. Peito pra cima, braços cruzados, mãos segurando a cabeça, significa que ele é um infiel assumido; um machão orgulhoso de seus culhões fedidos a baixos critérios. Barriga pra baixo, corpo voltado ao colchão; ele quer sexo.
Três, quatro, cinco carreiras; correrias, adaptadores de MP3, danças caretas e frenéticas; só nós dois no salão. Uma criança dormia. A outra, de olheiras fundas, jogava o video-game do papai-noel. O pai das crianças, anfitrião da festa, constrangido, não sabia de adaptadores de MP3, não sabia das crianças, mas sabia das sete, oito, nove, dez, onze carreiras. Constrangido, no banheiro. Constrangido, e vermelho. Constrangido, e malvado. Egoísta, pérfido, só queria compartilhar. Treze, quatorze, quinze carreiras. Ele, o meu amor, no dia da festa, constrangido, mas de constrangimentos bonitos, completos e partidos. Partidos pela necessidade constrangida de compartilhar, de não deixar o pai das crianças que ele, meu amor, amava, ali, sozinho, pérfido, dezoito, dezenove carreiras. Naquele dia da festa ele compartilhou de toda imundíce que seu constrangimento até então o havia impedido de compactuar mas, naquele dia da festa, vendo o pai, assim, sozinho, fodendo com todos, teve que foder também. E dormiu, segundo algum programa de televisão que as donas de casa assistem pela manhã depois que as crianças acordam e enquanto esquentam o leite no microondas, como um homem infiel. E a festa acabou na garagem disfarçada de quarto, com goteiras ao lado da cama e meu amor vomitando o peso de um caráter morto. E o desenho da criança, que dormia ou jogava (ninguém mais sabia) ficou ali, escorregou do imã da geladeira que ficava na garagem gelando as últimas cervejas enquanto eu fumava e pensava nele (o desenho) parado na poça da goteira, submerso. Olhei bem pra ele, uma festa de lápis de cêra que compunha um castelo, afogado. E ele, meu amor, meu anjo azul, entregue ao sono dos infiéis.
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