[então, um pouco de cultura]
É fato que já se disse tudo que se poderia dizer a respeito de "Casablanca"; os diálogos sensacionais ("de todos os bares do mundo, ela tinha que entrar justo no meu" = nascimento de um chavão), aquele saber usar do preto e branco (Ingrid Bergman escolhendo lenços num camelô usando uma blusa em listras horizontais que cai muito muito bem com a gravata em listras verticais de Humphrey Bogart, por exemplo), iluminação e efeitos de neblina, essas coisas.
Mas ontem assisti um outro filme do mesmo diretor chamado "Anjos de Cara Suja" ("Angels with Dirty Faces", de 1938) e entendi por que Michael Curtiz é um diretor esquecido entre os grandes nomes da época. Ele não filma o amor, filma os homens.
Assim como em Casablanca, trata-se de uma história de amizade entre os homens e de como eles independem das mulheres quando vão tomar seu rumo na vida. Todo o blá-blá-blá de como meninos traquinas vão parar na marginalidade mas continuam sendo boas almas não passa de pano de fundo pra dizer que a amizade entre eles nunca muda, mesmo que um vire padre e outro continue um bad boy.
É exatamente como em Casablanca, não é a toa que a frase final do filme não diz respeito à personagem de Ingrid Bergman mas sim a um oficial nazista. Deixando pra trás o avião que levará sua garota para sempre Bogart dirige-se ao oficial alemão e diz "Acho que aqui está nascendo uma grande amizade" e os dois seguem empinando uma garrafa de algum líquido alcoólico.
E é isso, o grande problema é que Curtiz filmava melhor o amor conjugal do que amizade entre os homens e não sabia disso, assim como a maioria das pessoas não sabe que Casablanca não é um filme sobre o amor, é muito mais sobre homossexualismo e alcoolismo, e a maioria das amizades entre garotos vem daí. Genial.
Vai dizer que também não há uma conotação gay quando o pianista do Rick's Bar (grande companheiro de trago de Bogart) diz a Ingrid Bergman: "Fique longe dele, você dá azar"?